A transição energética no Brasil está se consolidando através de novas leis como Lei do Combustível do Futuro e o Marco Legal do Hidrogênio e, previamente, com o programa RenovaBio. Este cenário aponta para uma mudança significativa no perfil da matriz de combustíveis com um crescente destaque para biocombustíveis e a inclusão do hidrogênio no mercado industrial. A localização das novas unidades de produção de biocombustíveis e hidrogênio e a concentração de demanda em regiões do país exigirá a ampliação da logística de movimentação de produtos e consequentemente da infraestrutura.
Localização das Usinas de Produção
A produção de biocombustíveis no Brasil ocorre de forma distribuída, diferentemente dos combustíveis fósseis, que estão concentrados em polos específicos. Essa descentralização reflete o uso de biomassa, produzida localmente e proporciona oportunidades econômicas regionais. No caso do etanol e biodiesel, por exemplo, as usinas estão predominantemente localizadas nas regiões produtoras de cana-de-açúcar, milho e soja, como o Sudeste, Centro-Oeste e Sul. Já para combustíveis avançados como o SAF (Sustainable Aviation Fuel) e o HVO (Hydrotreated Vegetable Oil), as usinas se concentram em áreas estratégicas que facilitam a distribuição e exportação, incluindo os estados de São Paulo e Bahia.
Fig 1 – Localização das unidades de produção de combustíveis no país
A produção de hidrogênio, por sua vez, está alinhada com polos logísticos e portuários. Hubs de hidrogênio verde estão sendo estabelecidos em regiões como Pecém e Fortaleza, no Ceará, e Porto do Açu, no Rio de Janeiro, que são locais com acesso facilitado ao mercado internacional e infraestrutura para transporte. Esses hubs promovem uma integração entre a produção e a logística necessária para movimentar o produto.
Novos Fluxos Logísticos
O aumento da demanda por biocombustíveis tradicionais, gerada pelo aumento significativo da mistura nos combustíveis fósseis nos próximos dez anos, ampliará os volumes transportados nas rotas consolidadas atualmente. Soma-se a isso, o crescimento de novas regiões produtoras para etanol de milho e etanol de 2ª geração. Este cenário exigirá o redimensionamento da infraestrutura para transporte e armazenagem nas principais rotas de biocombustíveis no país.
Por outro lado, é importante ressaltar que os fluxos de derivados continuarão existindo, em função do crescimento estrutural da demanda por combustíveis no Brasil, embora com uma taxa de crescimento mais moderada. Os fluxos logísticos para suprimento de derivados em cadeias de distribuição deficitárias no Norte, Centro Oeste e Sul do país, serão mantidos, mesmo com a substituição do diesel S500 por S10, que também ocorrerá dentro deste período de dez anos.
O posicionamento da oferta futura de biocombustíveis avançados irá gerar novos fluxos. A distribuição de HVO no país, criará rotas que terão volume crescente ao longo do tempo de acordo com os percentuais de mistura regulamentados pela ANP. O SAF terá movimentação entre as unidades produtoras e principais aeroportos do país, para atender a regulamentação estabelecida pela CORSIA.
No caso do hidrogênio, a localização de sua oferta em terminais marítimos ou em seu entorno facilita o transporte para outras regiões do país ou sua exportação. São esperados fluxos de hidrogênio em um primeiro momento para suprimento da indústria siderúrgica, de cimento e fertilizantes. A utilização como combustível no Brasil deverá ocorrer somente em uma etapa futura, fora do horizonte em discussão.
Fig 2 – Exemplos de fluxos logísticos atuais e futuros
A criação desses novos fluxos logísticos, combinados com os fluxos existentes de biocombustíveis e derivados, levará a uma reavaliação do uso dos modais de transporte, de forma a garantir que os produtos renováveis sejam movimentados de maneira eficiente. O uso de modais de alto volume, como transporte marítimo, ferroviário e dutoviário, é essencial para evitar a fragmentação e ineficiência associadas ao transporte rodoviário. A transição energética irá gerar um desafio logístico e uma oportunidade para transformar a matriz de transporte de combustíveis no Brasil.
Investimentos em Infraestrutura e Planejamento Estratégico
A ampliação dos fluxos logísticos exigirá um investimento contínuo em novas infraestruturas. Para assegurar que derivados, biocombustíveis e hidrogênio possam ser transportados de forma competitiva, é fundamental que o Brasil mantenha e expanda seus modais de alto volume. A ampliação e construção de terminais marítimos e ferroviários, além do aumento da capacidade de transporte em dutos e ferrovias, é indispensável para evitar que o sistema logístico tenha gargalos, o que poderia gerar ineficiências e aumentar os custos operacionais.
Fig 3 – Infraestrutura para movimentação de combustíveis e novos projetos
O planejamento estratégico da infraestrutura nacional será fundamental para o desenvolvimento da logística, enquanto a criação de um ambiente regulatório favorável, que incentive investimentos, será essencial para promover a segurança jurídica e atratividade do setor, acompanhando a rápida evolução da transição energética.
Conclusão
O Brasil se destaca hoje por seu domínio no uso de biocombustíveis e pela competitividade na produção de hidrogênio, mas para consolidar essa estratégia para a transição energética, é essencial a ampliação da infraestrutura logística. Pode-se afirmar que estamos iniciando um novo ciclo de desenvolvimento da logística de combustíveis no país. Com investimentos em infraestrutura e uma regulação alinhada aos desafios da transição energética, o país poderá consolidar-se como uma referência em logística para energias renováveis, e alcançar suas metas de redução de emissões.
Nota: este artigo foi publicado originalmente com exclusividade pela revista Brasil Energia.
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